O Ruído

Revista da Graduação da FAUFBA

Soberania cultural e urbanização

A relação dos fatos urbanos particulares com as utopias urbanas é um assunto que transcende à a-plicação à história da cidade de resultados de estu-dos fragmentados em períodos de tempo – antes, considera intentos e realizações como elementos i-gualmente relevantes do discurso arquitetônico. Na colonização do território brasileiro, por exemplo, as intenções dos padres jesuítas são importantes para a compreensão do desenvolvimento urbano no país, principalmente quando postas em contraste com as de outra instituição colonizadora: a família patriar-cal latifundiária. Devido às transforma-ções acontecidas na Europa desde o Renascimento, culminando com a Reforma Protestante, os movimentos existentes dentro da Igreja exigindo uma auto-reforma finalmente ganharam força. Três elementos foram fundamentais para a Reforma católica: a criação da Ordem dos Jesuítas, a reafirmação da Santa Inquisição e a convocação do Concílio de Trento. Entretanto, a fundação da Companhia de Jesus por Inácio de Loyola e outros jovens de diversos países foi o mais eficiente elemento das vitórias obtidas pelo catolicismo neste perío-do. Seu desejo de viver inteiramente o Evangelho os levou a uma vida de castidade, pobreza e obediência cega à orientação do Papa. Devido, justamente, a este voto de obediência, o Papa Paulo III reconheceu oficialmente a ordem Jesuíta em 1540, tendo sido a primeira ordem secular autenticada pelo Vaticano. Alguns de seus membros participaram do Concílio de Trento, tendo sido fundamental a sua influência. Mas foi por meio do ministério do ensino que os jesuítas deram sua maior contribuição para a igreja católica em ações de catequese e prepa-ração de novos sacerdotes, além do monopólio do ensino da elite européia. Em ambas as frentes de atuação – evangelismo e ensino -, as produções dramáticas eram utilizadas como elementos fundamentais de seu método de trabalho, tendo este costume se tornado uma influ-ência direta do desenvolvimento do teatro moderno. No caso específico do Brasil, a arte tradicional está tão intimamente ligada à presença dos jesuítas que, durante muito tempo, toda a arte colonial brasileira era chamada de arte jesuítica. Foram os primeiros construtores, escultores e pintores da maior parte do país em uma atividade comtínua desde a época da chegada em Salvador, em 1549, até 1759, quando a ordem foi expulsa do Brasil. Entretanto, em todo este período, os jesuítas se mantiveram fiéis aos princípios da Contra-Reforma. Devido a estas características áreas de atuação e a seu caráter disciplinado, os jesuítas foram muito importantes para a defesa do catolicismo e sua propagação na América e na África. Porém, este fato não pode ser compreendido apenas do ponto de vista da defesa de uma religião, mas principalmente como o fundamento da colonização ideológica do Novo Mundo. Ao buscar sustentar os padrões éticos e morais católicos entre os colonizadores e expandir estes padrões para os nativos e escravos por meio da evangelização, os jesuítas se colocavam diante da preservação desta soberania cultural em uma posição equivalente à do exército em relação à manutenção da integridade física do povo e dos limites da colônia.

12, setembro, 2006 Posted by | artigos | Deixe um comentário